sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Devaneios etcétera e tal...: Aconteceu comigo ontem.O que podemos fazer?

Devaneios etcétera e tal...: Aconteceu comigo ontem.O que podemos fazer?: "Nosso país está em processo de decomposição e ninguém reclama do odor fétido que inala. Mas enquanto isto não ocorre muitos jovens continua..."

Aconteceu comigo ontem.O que podemos fazer?

Nosso país está em processo de decomposição e ninguém reclama do odor fétido que inala.

Mas enquanto isto não ocorre muitos jovens continuarão a ser estuprados, outros assassinados, e os pais que os perdem se mantendo em pé com a ajuda de aparelhos fictícios que lhe forneçam ar para poder continuar respirando.
Hoje morrer é ridículo de tão fácil, quem não foi seqüestrado, assaltado, violentado está fora de moda.
Você não acabou ainda de ler o livro de Proust ou Paulo Coelho (quis aqui colocar os dois lados extremos da literatura), de abrir a última Marie Claire para ver as tendências, ou virar as páginas da Zero Hora para saber quem foi o sorteado num concurso ou para a morte, faça logo, pois amanhã poderá ser tarde demais, pois basta virar a esquina errada, entrar na rua à direita e não a da esquerda, abrir o portão de sua casa com mais tranqüilidade, atender a um telefonema que nem era endereçado a você e...
E é sobre este último que quero tratar, porque os outros já foram tão falados e debatidos e até agora ninguém achou a solução, ou nem se interessou por achá-la. Até que algo aconteça com um familiar seu.
Já não sou tão moça , mas quero enfatizar que criei meus filhos sob a égide deste pânico de sobrevivência, levando e buscando no colégio para não roubarem a camiseta, os tênis, os óculos evitando assim que fossem mortos por estas banalidades; já busquei das baladas para que um amigo não os trouxesse após ter ingerido álcool em demasia e sofrerem um acidente desnecessário, já cansei de conversar,quando adolescentes, sobre más companhias , sexo seguro, bebidas, drogas..
E hoje com eles adultos me enfio em casa antes que escureça, pois nos passam a idéia, lêdo engano, que os assassinos começam a agir quando as luzes da cidade acendem e precisamos ir para a toca, nos enfurnar por trás das grades , das cercas elétricas, enfim, nos resguardar do perigo.
Bem, são 19.30 horas,de uma quinta- feira qualquer, já me encontro dentro de meu apartamento, na frente do computador, celular ao lado sempre ligado em conexão com o mundo lá fora, portaria 24 horas que me dá uma pseudo segurança, cercas elétricas acionadas...e eis que dentro desta redoma impenetrável toca o celular e a voz da minha filha, que a esta hora deveria estar saindo do consultório para ir a um curso, desesperada, me diz aos prantos:
-Mãe estou sendo assaltada.Tem um revólver na minha cabeça.
Neste momento a voz de um homem intercepta a ligação e me diz de maneira simples como pedir uma coca zero no bar da esquina, que se eu não der dinheiro a ele, minha filha vai virar presunto e que eu decida já – ou dá ou desce- na linguagem popular.
Retornei naquele instante à época do vestibular na prova de gramática, dificílima por sinal, que dependendo da cruzinha errada no círculo eu estava dentro ou fora da faculdade.
Procurei me acalmar, me lembrar de todos os e-mails que recebi me alertando dos trotes que estavam passando para os menos avisados, mas a voz era dela, eu juro, o celular também não respondia (enquanto falava com o cidadão ligava do meu telefone residencial prá ela) e eu precisava me certificar que era um grande mentira aquele pesadelo todo.
E nestes minutos que pareceram horas , minha dúvida permanecia como no dia do meu vestibular de colocar a cruz no parênteses a, b ou c só que a diferença era que o meu erro seria a cruz definitiva na vida dela.
O celular não atendia e eu cada vez mais tendo a certeza que era tudo verdade, que não se tratava de um trote de dentro de uma penitenciaria no Amapá, Rio de Janeiro ou nos confins do inferno, onde o cabra da peste digitou por um azar o meu número. Eu juro que se tivesse dinheiro teria saído ensandecida para colocá-lo na conta laranja do tal bandido. Eu só queria ver o sorriso e a voz de minha filha de novo!Mas nem dinheiro eu tinha como 90% dos brasileiros.
Disse ao tal homem que não tinha a grana que ele me pedia ao que me respondeu que não se comovia com histórias tristes e que a vida da minha filha dependia do meu sim ou não. Para ele era uma a mais ou a menos, apenas!
Enquanto isto tentava insistentemente ligar para o celular dela tentando ganhar tempo com aquele maldito homem que veio me tirar a paz dentro de minha própria casa.
Foram os piores cinco minutos da minha vida. Era a escolha de Sofia.
Quando ele me disse que não tinha mais paciência e ia matá-la ela atende o celular com a maior tranquilidade e me diz:
- Estava em atendimento por isto não retornei aos teus telefonemas. O que houve?
Neste momento meu parto de cócoras foi um sucesso.A criança nasceu foi colocada no meu regaço e deu o grito de vida!
Respondi, neste momento, ao sujeito do outro lado da linha, assim como alguém que recebe uma “cola” certeira na última hora da prova:
-pode matá-la.
E desliguei.
Enquanto minha respiração voltava ao normal, meu coração retornava ao peito, aparecia na tela da televisão a cara dos candidatos ao próximo pleito com suas eternas promessas não cumpridas.
Naquela noite, pedi a ela algo inusitado:
-Vem dormir com a mãe como fazíamos quando  eras pequena?
E dormimos abraçadas e eu agradecendo por tudo que não aconteceu!