domingo, 3 de julho de 2011

Minimamente feliz...



A felicidade é a soma das pequenas felicidades. Li essa frase num outdoor em Paris e soube, naquele momento, que meu conceito de felicidade tinha acabado de mudar. Eu já suspeitava que a felicidade com letras maiúsculas não existia, mas dava a ela o benefício da dúvida.

Afinal, desde que nos entendemos por gente aprendemos a sonhar com essa felicidade no superlativo. Mas ali, vendo aquele outdoor estrategicamente colocado no meio do meu caminho (que de certa forma coincidia com o meio da minha trajetória de vida), tive certeza de que a felicidade, ao contrário do que nos ensinaram os contos de fadas e os filmes de Hollywood, não é um estado mágico e duradouro.
Na vida real, o que existe é uma felicidade homeopática, distribuída em conta-gotas. Um pôr-de-sol aqui, um beijo ali, uma xícara de café recém-coado, um livro que a gente não consegue fechar, um homem que nos faz sonhar, uma amiga que nos faz rir. São situações e momentos que vamos empilhando com o cuidado e a delicadeza que merecem alegrias de pequeno e médio porte e até grandes (ainda que fugazes) alegrias.
Eu contabilizo tudo de bom que me aparece', sou adepta da felicidade homeopática. 'Se o zíper daquele vestido que eu adoro volta a fechar (ufa!) ou se pego um congestionamento muito menor do que eu esperava, tenho consciência de que são momentos de felicidade e vivo cada segundo.
Alguns crescem esperando a felicidade com maiúsculas e na primeira pessoa do plural: 'Eu me imaginava sempre com um homem lindo do lado, dizendo que me amava e me levando pra lugares mágicos Agora, se descobre que dá pra ser feliz no singular:
Quando estou na estrada dirigindo e ouvindo as músicas que eu amo, é um momento de pura felicidade. Olho a paisagem, canto, sinto um bem-estar indescritível'.
Uma empresária que conheci recentemente me contou que estava falando e rindo sozinha quando o marido chegou em casa. Assustado, ele perguntou com quem ela estava conversando: 'Comigo mesma', respondeu. 'Adoro conversar com pessoas inteligentes'.
Criada para viver grandes momentos, grandes amores e aquela felicidade dos filmes, a empresária trocou os roteiros fantasiosos por prazeres mais simples e aprendeu duas lições básicas: que podemos viver momentos ótimos mesmo não estando acompanhadas e que não tem sentido esperar até que um fato mágico nos faça felizes.
Esperar para ser feliz, aliás, é um esporte que abandonei há tempos. E faz parte da minha 'dieta de felicidade' o uso moderadíssimo da palavra'quando'.
Aquela história de 'quando eu ganhar na Mega Sena', 'quando eu me casar', 'quando tiver filhos', 'quando meus filhos crescerem', 'quando eu tiver um emprego fabuloso' ou 'quando encontrar um homem que me mereça', tudo isso serve apenas para nos distrair e nos fazer esquecer da felicidade de hoje. Esperar o príncipe encantado, por exemplo, tem coisa mais sem sentido? Mesmo porque quase sempre os súditos são mais interessantes do que os príncipes; ou você acha que a Camilla Parker-Bowles está mais bem servida do que a Victoria Beckham?
Como tantos já disseram tantas vezes, aproveitem o momento, amigos. E quem for ruim de contas recorra à calculadora para ir somando as pequenas felicidades.
Podem até dizer que nos falta ambição, que essa soma de pequenas alegrias é uma operação matemática muito modesta para os nossos tempos. Que digam.
Melhor ser minimamente feliz várias vezes por dia, do que viver eternamente em compasso de espera.



Leila Ferreira, jornalista

terça-feira, 28 de junho de 2011

Síndrome do cagassus virtualis

Afinal, qual é a pronúncia: ráquers ou rêiquers? Dúvida atroz, essa. Ouvi as duas versões, na mesma emissora, em dois noticiários diferentes. Arrá, diria nosso nobre deputado Carry On, cheio de ufanismo gaudério. Hackers, isso é lá com os imperialistas. Troquemos por invasores ou algo do tipo. À parte o detalhe do como se fala – e esquecendo os preciosistas, que fazem malabarismo facial para pronunciar comme Il faut –, o fato é que, sim, não existe limite para quem sabe mexer com “essas coisas” de internet. E não, ninguém, nem Serpro, nem CIA, nem a mãe do badanha pode garantir que qualquer página, qualquer e-mail, qualquer coisa lançada no tal de ciberespaço (sáiberespaço, cyberspace etc ) está imune ao conhecimento de um guri espinhento trancado no quarto da casa da mamãe. É só saber. E é só querer.
Tenho manifestado minha revolta com os chatos da rede, que entram nos perfis do facebook (feicebúque?) só pra acrescentar mais um “miguxo’ na rede. E, em especial, odeio, detesto, tenho ojeriza pelos que mandam perguntinhas calhordas que exigem, mais do que se baixar um programa invasivo, que a gente assine recibo de burro.
Mesmo assim, não vivo sem internet. Não imagino a vida sem ela. E aqueles planos de ir pra Serra da Estrela, em Portugal, praquela casinha de pedra ao lado de um riacho, sem telefone ou qualquer antena que permita se plugar em qualquer coisa, estes projetos vão ser, eternamente, coisas idealizadas para inglês ver. Tô fora. Quero mais é ligar meu computador todas as manhãs, espiar a caixa de entrada do mail e entrar, sofregamente, como se disso dependesse minha sobrevivência, no feice e, hoje com menos vontade, no tuíter.
Dito isso tudo, a maneira de entróito, foco na invasão dos háquers nos sites do governo brasileiro e, sinceramente, não sei se é pra rir ou pra chorar com as justificativas, tipo penico furado, das nossas otoridádi em cibernética. É patético ver o que dizem de bobagem, prontos pra nos enfiar na cara o nariz de palhaço que há tempos estão distribuindo nestes brasis.
O ruim de tudo é esta sensação de que pode tudo. Tenho um grande e amado amigo, do teatro, que já me mandou calar a boca várias vezes quando me atrevo a mostrar opiniões não pedidas, em especial de política, com argumentos que fazem qualquer um de bom senso puxar o freio. Diz ele que “os caras” têm a faca e o queijo na mão, que é só querer, puxam meus dados no computador e enfiam informações que podem ralar com minha vida até as próximas 15 encarnações. Exagero dele? Já tô achando que não.
Lembro de um filme com a Sandra Bullock em que ela é funcionária de alguma coisa no governo e descobre uma falcatrua qualquer e é descoberta porque descobriu, entendem? E, aos poucos, além de querer matar a moça fisicamente, vão matando a dita cuja aos poucos, eliminando suas informações, seus números de carteira de identidade, seu registro de nascimento, por aí vai. Ficção, claro.
O bom de tudo isso é que nem o pai, nem a mãe, nem o filho do Badanha podem sair ilesos de suas safadezas quando alguém quiser torná-las públicas. Basta um provedor, um computador e um cara esperto e destemido. Eu, aqui, fico dedilhando estas linhas e pensando que alguém, em algum lugar, por algum motivo, as está acessando neste exato momento. Então, fica o recado. Se, de repente, eu sumir, ou, pior, alguém começar a escrever aqui falando tudo ao contrário do que sempre falei, já sabem, Ou fui abduzida ou simplesmente sumida por alguém ráquer (háquer? Heiquer? Rêiquer?) a mando de sabe-se lá quem. Durmam tranquilos. Se puderem.(Maristela Barrios)

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Sermão da montanha sob nova versão




Naquele tempo, Jesus subiu a um monte seguido pela multidão e, sentado sobre uma grande pedra, deixou que os seus discípulos e seguidores se aproximassem.
Ele os preparava para serem os educadores capazes de transmitir a lição da Boa Nova a todos os homens.
Tomando a palavra, disse-lhes:

- Em verdade, em verdade vos digo:
- Felizes os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus.
- Felizes os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados.
- Felizes os misericordiosos, porque eles...?

Pedro o interrompeu:
- Mestre, vamos ter que saber isso de cor?
André perguntou:
- É pra copiar?
Filipe lamentou-se:
- Esqueci meu papiro!
Bartolomeu quis saber:
- Vai cair na prova?
João levantou a mão:
- Posso ir ao banheiro?
Judas Iscariotes resmungou:
- O que é que a gente vai ganhar com isso?
Judas Tadeu defendeu-se:
- Foi o outro Judas que perguntou!
Tomé questionou:
- Tem uma fórmula pra provar que isso tá certo?
Tiago Maior indagou:
- Vai valer nota?
Tiago Menor reclamou:
- Não ouvi nada, com esse grandão na minha frente.
Simão Zelote gritou, nervoso:
- Mas porque é que não dá logo a resposta e pronto!?
Mateus queixou-se:
- Eu não entendi nada, ninguém entendeu nada!

Um dos fariseus, que nunca tinha estado diante de uma multidão nem ensinado nada a ninguém, tomou a palavra e dirigiu-se a Jesus, dizendo:
- Isso que o senhor está fazendo é uma aula?
- Onde está o seu plano de curso e a avaliação diagnóstica?
- Quais são os objetivos gerais e específicos?
- Quais são as suas estratégias para recuperação dos conhecimentos prévios?
Caifás emendou:
- Fez uma programação que inclua os temas transversais e atividades integradoras com outras disciplinas?
- E os espaços para incluir os parâmetros curriculares gerais?
- Elaborou os conteúdos conceituais, processuais e atitudinais?
Pilatos, sentado lá no fundão, disse a Jesus:
- Quero ver as avaliações da primeira, segunda e terceira etapas e reservo-me o direito de, ao final, aumentar as notas dos seus discípulos para que se cumpram as promessas do Imperador de um ensino de qualidade.
- Nem pensar em números e estatísticas que coloquem em dúvida a eficácia do nosso projeto.
- E vê lá se não vai reprovar alguém!

E, foi nesse momento que Jesus disse: "Senhor, por que me abandonastes..."

segunda-feira, 30 de maio de 2011

O que seria uma vida de luxo?





É impossível viver sem ele; só que existem luxos e luxos.
Para a milionária Barbara Hutton, a herdeira mais rica dos Estados Unidos, um deles foi mandar fabricar um Rolls-Royce em tamanho pequeno para dar de presente a seu filho, então com 9 anos. E, para motorista do carro, contratou um anão. Será que ter dinheiro demais pira a cabeça das pessoas, elas nunca ficam satisfeitas?
Detalhe: depois de nove casamentos, Barbara Hutton morreu pobre.
Para não ser radical, admito que algum dinheiro sempre ajuda, mas não é tão fundamental assim.
Então vou falar de algumas coisas que são, para mim, o luxo dos luxos e que não custam quase nada.
Acordar num domingo de manhã sabendo que a faxineira não vem, que todos os eletrodomésticos da casa estão funcionando e que, com a graça de Deus, o telefone não vai tocar. O dia será silencioso, e o único movimento na casa será o dos cachorros que para ser sincera estão velhos e nem se mexem muito.Dormem. Um domingo assim é um luxo total. Outra preciosidade é, depois de passar 20 dias sem comer carboidrato, nem unzinho, pegar no armário aquela calça de 15 anos atrás, quando você era uma sílfide, e o zíper fechar.
A felicidade é maior do que se ganhasse um brilhante. E quando você chega da rua, com um calor de matar, pega um copo (bonito, de preferência) e toma uma água bem gelada,  não é um luxo? Se puser dentro de uma jarra (bonita, de preferência) cascas de limão-siciliano e deixar na geladeira, vai ser a água mais fresquinha e perfumada que já tomou.
Não é um superluxo? Aí você se refresca num chuveiro e depois vai para o quarto, liga o ar-condicionado e se deita numa cama com lençóis brancos limpinhos, cheirosos. Tem luxo maior?
Dar um mergulho num mar azul, sem ondas, sem se preocupar com os cabelos, e depois tomar uma água de coco? E então comer um peixe grelhado, temperado apenas com sal, limão e um fio de azeite. Depois de passar por várias paixões sofridas e alguns casamentos errados, não estar apaixonada é um luxo. Uma sexta-feira, às 7 da noite, você está sozinha, sem a angústia de esperar aquele telefonema.
Sente-se independente e decide sair. Enquanto pinta o olho, começa a pensar em que restaurante vai sem ninguém para dizer que prefere outro.Quando chega lá, toma dois drinques sabendo que é uma mulher livre e resolvida, que não precisa de ninguém para uma coisa tão banal, que é jantar fora. Não é um luxo?
Bom demais é ter resistido à compra daquele vestido lindo, que fez você ficar duas noites sem dormir pensando “compro ou não compro?”, e passar pela loja uma semana depois, ver que ele está em liquidação, pela metade do preço, e que você nem o quer mais. E quando chega de uma reunião de trabalho com a cabeça quente, se sentindo um lixo, e a empregada fez aquela sobremesa que você adora, não é como se o Universo estivesse todo a seu favor?
E o resultado do exame avisando que sua saúde está ótima?
 E seu filho que telefona para dizer que está com saudades?
Bem, coisas simples como estas  me fazem feliz e felicidade é o verdadeiro luxo que podemos usufruir.



sábado, 28 de maio de 2011

Afinal o que é o amor?(Carpinejar)




— Não confie na frase de sua avó, de sua mãe, de sua irmã de que um dia encontrará um homem que você merece.
Não existe justiça no amor.
O amor não é censo, não é matemática, não é senso de medida, não é socialismo.
É o mais completo desequilíbrio. Ama-se logo quem a gente odiava, quem a gente provocava, quem a gente debochava. Exatamente o nosso avesso, o nosso contrário, a nossa negação.
O amor não é democrático, não é optar e gostar, não é promoção, não é prêmio de bom comportamento.
O melhor para você é o pior. Aquele que você escolhe infelizmente não tem química, não dura nem uma hora. O pior para você é o melhor. Aquele de quem você procura distância é que se aproxima e não larga sua boca.
Amor é engolir de volta os conselhos dados às amigas.
É viver em crise: ou por não merecer a companhia ou por não se merecer.
Amor é ironia. Largará tudo — profissão, cidade, família — e não será suficiente. Aceitará tudo — filhos problemáticos, horários quebrados, ex histérica — e não será suficiente.
Não se apaixonará pela pessoa ideal, mas por aquela que não conseguirá se separar. A convivência é apenas o fracasso da despedida. O beijo é apenas a incompetência do aceno.
Amar talvez seja surdez, um dos dois não foi embora, só isso; ele não ouviu o fora e ficou parado, besta, ouvindo seus olhos.
Amor é contravenção. Buscará um terrorista somente para você. Pedirá exclusividade, vida secreta, pacto de sangue, esconderijo no quarto. Apagará o mundo dele, terá inveja de suas velhas amizades, de suas novas amizades, cerceará o sujeito com perguntas, ameaçará o sujeito com gentilezas, reclamará por mais espaço quando ele já loteou o invisível.
Ninguém que ama percebe que exige demais; afirmará que ainda é pouco, afirmará que a cobrança é necessária. Deseja-se desculpa a qualquer momento, perdão a qualquer ruído.
Amar não tem igualdade, é populismo, é assistencialismo, é querer ser beneficiado acima de todos, é ser corrompido pela predileção, corroído pelo favoritismo. É não fazer outra coisa senão esperar algum mimo, algum abraço, algum sentido.
Amor não tem saída: reclama-se da rotina ou quando ele está diferente. É censura (Por que você falou aquilo?), é ditadura (Você não devia ter feito aquilo!). É discutir a noite inteira para corrigir uma palavra áspera, discutir metade da manhã até estacionar o silêncio.
Amor é uma injustiça, minha filha. Uma monstruosidade.
Você mentirá várias vezes que nunca amará ele de novo e sempre amará, absolutamente porque não tem nenhum controle sobre o amor

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Fazer um brinde a si mesmo ...vale a pena!




Poucas situações na vida são mais angustiantes do que viver um amor não correspondido. No entanto, pouquíssimas são as pessoas que nunca experimentaram algo semelhante. Ou seja, amar e não ser amado é, em última instância, uma dor comum, embora bastante pessoal.

E por que será que ainda assim, sendo tão recorrente e fazendo parte da história de bilhões de seres humanos, continua sendo tão difícil lidar com o fato de que o outro não está a fim de continuar ou sequer de começar um relacionamento com a gente?

O fato é que aprender a lidar com a frustração da não correspondência de qualquer sentimento, especialmente dos mais intensos e profundos, é uma das mais duras e importantes lições de todos nós!

A começar pela capacidade de compreender que a razão de o outro não gostar de você da mesma forma que você gosta dele não tem a ver com quem você é exatamente. Ou seja, você certamente é alguém com qualidades suficientes para ser amado, entretanto, isso não é garantia para que a química de um encontro dê certo.

Quando falamos de amor, desejo e vontade, temos de considerar que sempre existe mais de uma parte envolvida. É a máxima do dito popular que avisa que quando um não quer, dois não brigam ou não se amam, como é o nosso caso. Mas os motivos pelos quais uma pessoa não corresponde ao seu amor estão longe de ser passíveis de explicação lógica.

Amamos e não amamos por motivos inefáveis, que não estão ao alcance das palavras ou da inteligência racional. Talvez isso explique por que, algumas vezes, amamos aquela pessoa não aprovadas pela maioria de nossos amigos e familiares. Ou por que, noutras vezes, não conseguimos amar aquela que todos dizem ser a ideal para nós, a perfeita.

Esta é a prova de que ficar se consumindo na tentativa de compreender, logicamente, por que o outro não está correspondendo nosso amor é inútil, ineficiente e só nos faz doer mais ainda. Esta é a prova, sobretudo, de que não ser amado por determinada pessoa não é um veredito, não é uma sentença, não é o fim.

Talvez, muito pelo contrário, seja apenas o começo. Seja a nossa grande chance de descobrir uma alternativa melhor. Sim, porque não prevemos o futuro. Não sabemos o que virá. E por isso mesmo deveríamos confiar um pouco mais no fluxo do Universo.

Certamente, já aconteceu com você de considerar um acontecimento péssimo, desastroso e, depois de alguns dias ou meses, ter se dado conta de que algo muito lindo, maravilhoso e imperdível só aconteceu porque havia o espaço deixado pelo que havia considerado um desastre.

Enfim, não ser correspondido hoje é ruim, eu sei. Dói. E por isso mesmo, sugiro que você chore, esperneie, desabafe e faça o que for possível, dentro das opções saudáveis, de preferência, para esgotar sua frustração e se sentir melhor. Porém, não se destrua, não se acabe e não tome as circunstâncias como determinantes de sua infelicidade.

Permita-se viver um dia de cada vez, apostando que cada noite que chega significa que você está mais distante da tristeza e mais perto de uma nova alegria. Permita-se acreditar que o sol voltará a brilhar em seu coração mais cedo do que você imagina... E siga o fluxo da existência.

E, assim, certo de que ser correspondido é tão possível quanto não ser, e que essa é uma verdade que vale para todas as pessoas deste planeta – até mesmo para aquelas consideradas as mais lindas e sensuais – levante-se, lave esse rosto, vista-se como se fosse celebrar e faça um brinde a si mesmo, ao amor e ao melhor que está por vir!





sábado, 7 de maio de 2011

Aonde estão as pessoas no meio de tanta gente?

“E não é que neste mundo tem cada vez mais gente e cada vez menos pessoas?”. Talvez ali, no corredor do shopping, não fossem pessoas – só gente. Porque nascemos gente – mas só nos tornamos pessoas se fizermos o movimento. (Eliane Brum)






O cotidiano parece se repetir conforme o previsto até que você é empalado por uma cena. Eu saía da loja de um shopping de São Paulo, na tarde de sábado, quando ele passou por mim. Não sei se era a forma como o ar se deslocava de outro jeito ao redor dele, mas eu ainda não o tinha visto e minhas mãos já se estendiam no ar para ampará-lo. Ou talvez fosse só impressão minha, uma vontade estancada antes do movimento. Era um homem velho. Mas mais do que velho, era um homem doente. Cada um dos seus passos se dava por uma coragem tão grande, porque até o pé aterrissar no chão me parecia que ele podia retroceder ou cair. Mas ele avançava. E porque ele avançava na minha frente eu pude ver aquilo que outras partes de mim já haviam percebido antes. Sobre a sua cabeça havia uma peruca tão falsa que servia apenas para revelar aquilo que ele pretendia esconder. E de uma cor tão diferente do seu cabelo branco que parecia descuido de quem o amava ou não amava. Aquilo doía porque havia uma vaidade nele, a preocupação de ocultar a nudez da cabeça. E a peruca mal feita a expunha como um fracasso. A cada um de seus passos de epopeia sua camisa subia revelando um largo pedaço da fralda geriátrica. E assim ele avançava como uma denúncia claudicante da fragilidade de todos nós. Atravessando o corredor do shopping, lugar onde fingimos poder comprar tudo o que nos falta, consumidos pelo medo dessa vida que já começa nos garantindo apenas o fim.

Eu o seguia nesse balé sem coreografia quando ouvi os risinhos. Olhei ao redor e vi as pessoas se cutucando. Olha lá. Olha lá que engraçado. Ele tinha virado piada. Aquele homem desconhecido deixara a sua casa e atravessava o shopping. Para isso empreendera seus melhores esforços. Tinha vestido a peruca para que não percebessem sua calvície. Tinha colocado a fralda para não se urinar no meio do corredor. E caminhava podendo cair a cada passo. E as pessoas ao seu redor riam. E por um momento temi uma cena de filme, quando de repente todos começam a gargalhar e há apenas o homem em silêncio. O homem que não compreende. Até enxergar seu reflexo no olhar que o outro lhe devolve e ser aniquilado porque tudo o que veem nele não é um homem tentando viver, mas uma chance de garantir sua superioridade e sua diferença.
Quando entrevisto algum escritor costumo perguntar: por que você escreve? Alguns me respondem que escrevem para não matar. Eu também escrevo para não matar. Acho que na maior parte das vezes a gente escreve, pinta, cozinha, compõe, costura, cria, enfim, porque não sabe o que fazer com as pessoas que riem enquanto alguém tenta atravessar o corredor do shopping sem ter forças para atravessar o corredor do shopping.
O que me horroriza, mais do que os grandes massacres estampados no noticiário, são essas pequenas maldades do cotidiano. E só consigo compreender os grandes massacres a partir dos pequenos massacres de todo dia. Os risinhos e dedos que apontam, os cotovelos que se cutucam.
Quem pratica os massacres miúdos do dia a dia é gente que se acha do bem, que não cometeu nenhum delito, que vai trabalhar de manhã e dá presente de Natal. Gente com quem você pode conversar sobre o tempo enquanto espera o ônibus, que trabalha ao seu lado ou bem perto de você, e às vezes até lhe empresta o creme dental no banheiro. É destes que eu tenho mais medo, é com estes que eu não sei lidar.
Entrevistei muitos assassinos sem sobressalto, porque estava tudo ali, explícito. Era uma quebra. O que me parece mais difícil é lidar com o mal rotineiro e persistente, difícil de combater porque camuflado. O mal praticado com afinco pelos pequenos assassinos do cotidiano que nenhuma lei enquadra. E quando você os confronta, esboçam uma cara de espanto.
O pequeno mal está por toda parte. Possivelmente sempre esteve. Apenas que cada época tem suas peculiaridades. E na nossa somos cegados o tempo inteiro por imagens que nos chegam por telas de todos os tamanhos. E cada vez mais escolhemos as cenas que veremos, com quais nosso cérebro decidirá se comover. E as dividimos com os amigos no twitter, enviamos por email e parece até que há uma competição sobre quem consegue enviar mais rápido as imagens mais impactantes. Mas não sei se isso é ver. Não sei se isso nos coloca em contato de verdade.
Penso nisso porque acho que o mundo seria melhor – e a vida doeria um pouco menos – se cada um se esforçasse para vestir a pele do outro antes de rir, apontar e cutucar o colega para que não perca a chance de desprezar um outro, em geral mais vulnerável. Antes de julgar e de condenar. Antes de se achar melhor, mais esperto e mais inteligente. Vestir a pele do outro no minuto anterior ao salto na jugular.
Para mim é imediato me colocar na pele do homem que atravessa o corredor sem saber se vai chegar até o fim sem tombar. Mas é mais difícil me enfiar na pele das pessoas que riem, porque sinto raiva. E tenho a pretensão de não ter nada a ver com gente assim. Incorro então no mesmo erro, ao me pretender tão diferente daquele que me horroriza. É certo então que também eu cometi e cometo meus pecados de soberba. Por coerência – e eu valorizo a coerência – preciso me forçar. E eu me forço porque acredito nesse ato.
Quais são as razões delas, então? Por que ao testemunhar o homem que atravessa o shopping em passos trôpegos elas riem, se cutucam e apontam? Fiquei pensando se estas pessoas estão tão cegas pela avalanche de cenas em tempo real que para elas é apenas uma imagem da qual podem se descolar. É só mais uma cena que, como tantas a que assistimos todos os dias, não sabemos mais se é realidade ou ficção. Não é que não sabemos, apenas que parece que não importa, agora que os limites estão distendidos. Por que apenas assistimos às cenas – não as vemos nem entramos em contato.
E é esta a grande diferença num mundo de tanta visibilidade e tão pouco contato real. E o real aqui não é uma oposição entre o real e o virtual, mas o real real. Eu vejo você, eu toco em você, eu sinto a sua dor e me sujo com o seu sangue, ainda que seja pelo computador. É um jeito de estar no mundo e se relacionar com o outro disposto a se deixar tocar e a assumir os riscos de se deixar tocar. Me parece que estamos cada vez menos dispostos a isso – apesar de termos uma possibilidade grandiosa de acesso ao outro por conta da internet. Será que é isso? Dezenas de amigos no facebook e nenhum contato real, no sentido de se deixar transtornar e transformar pelo outro, para além das amenidades e da persistente troca de informações?
Será que era por isso que podiam rir? Por que não tinham nenhuma conexão com aquele outro ser humano? É curioso que agora o verbo conectar é mais usado para nos ligarmos a uma máquina que nos leva instantaneamente para a vida dos outros. Pela primeira vez somos capazes de nos conectar ao mundo inteiro. O que é mais fácil do que se conectar a uma só pessoa – ao homem doente que atravessa o corredor do shopping diante de nós. É curioso como agora podemos nos conectar – para nos desconectarmos.
E se, ao contrário, riam porque se sentiam tão conectadas a ele que precisavam rir para suportar? Pensei então que talvez pudesse ser esta a razão. Aquelas pessoas realmente enxergavam aquele homem – e por enxergar é que precisavam rir, se cutucar e apontar. Porque a fragilidade dele também é a delas, a de cada um de nós.
Nada nos garante que em algum momento da vida não estaremos nós também tentando atravessar o corredor do shopping por onde hoje caminhamos sem sentir. Nada nos assegura de que um dia não seremos nós a quase cair a cada passo. Se tivermos sorte e não morrermos de bala perdida ou de chuva, como afirmar que não usaremos fralda geriátrica ou tentaremos cobrir nossa calvície ou as marcas de uma quimioterapia com uma peruca que apenas denuncia aquilo que queríamos esconder?
Talvez seja esta a razão, pensei. Essas pessoas precisaram rir, cutucar e apontar para ter a certeza – momentânea e ilusória – de que ele não era elas. Não seria nunca. Só apontamos para o outro, para o diferente, para aquele que não somos nós. E quando apontamos para alguém é justamente para denunciar que ela não é como nós.
Neste caso, teria sido para se certificar. Elas diziam: Olha que peruca ridícula. Ou: Você viu que ele está de fralda? Mas na verdade estavam dizendo: O que acontece com ele nunca acontecerá comigo. Ou: Ele não tem nada a ver comigo. Por que deixam gente assim entrar num shopping?
Riam, cutucavam e apontavam por medo do que viam nele – de si mesmas.
São hipóteses, apenas. Uma tentativa de entender – de pensar e escrever em vez de responder com violência à violência que presenciei. E que me aniquila tanto quanto um massacre reconhecido no noticiário como massacre.
Talvez não seja nada disso. No Natal minha filha me deu de presente uma camiseta em que a Mafalda, a personagem do cartunista argentino Quino, dizia: “E não é que neste mundo tem cada vez mais gente e cada vez menos pessoas?”. Talvez ali, no corredor do shopping, não fossem pessoas – só gente. Porque nascemos gente – mas só nos tornamos pessoas se fizermos o movimento.



O que se quer afinal?



Uma mulher quer ser egoísta, mas também quer colocar comida na mesa, ter filhos, ser amada e cada dia mais feliz.

Uma mulher quer que suas unhas não quebrem nem descasquem. Uma mulher quer se sentir atraente com o peso que tem. Uma mulher quer ver seu trabalho valorizado. E quer ganhar dinheiro com ele. Uma mulher quer ser amada. Quer viver apaixonada. E quer se divertir.
Poderíamos encerrar a questão neste primeiro parágrafo, mas como a página necessita ser preenchida, avante.
Uma mulher quer ter filhos. Ou já quis um dia. Uma mulher com filhos quer ter mais tempo pra ela. E uma mulher com tempo de sobra quer uma rotina mais agitada. Uma mulher só não quer o tédio.
Uma mulher quer um cabelo que não precise ser constantemente pintado, arrumado, escovado. Um mulher quer conversar. Uma mulher quer ficar em silêncio. Uma mulher quer que lhe telefonem de surpresa e lhe digam coisas que a façam ficar sem palavras.
Uma mulher quer deixar um homem maluco. E ter, ela mesma, o direito de enlouquecer.
Uma mulher quer aprender a ser mais egoísta. Quer, ao menos uma vez na vida, pensar só nela e em mais ninguém.
Uma mulher quer inspirar um poema. Quer ser musa. Mas não quer ser confundida com mulher que não controlam a própria vaidade e pagam mico nas páginas das revistas.
Uma mulher quer colocar comida na mesa e que as crianças raspem o prato, uma mulher quer seus filhos saudáveis e felizes, uma mulher quer que eles durmam a noite toda, de preferência em casa.
Uma mulher quer desligar a tevê.
Uma mulher quer sexo. Uma mulher quer devorar um pão de meio quilo sem culpa. Uma mulher quer sair bonita na foto. Uma mulher quer dormir mais cedo. Uma mulher quer ser reparada na festa.
Uma mulher quer que seu carro não a deixe na mão. Uma mulher quer ser escutada. E quer escutar os homens, que pouco se abrem.
Uma mulher quer fazer algo pela sociedade. Quer ajudar quem precisa. Quer ser útil. Em troca, quer que a ajudem com as sacolas. E que a amparem na dor.
Uma mulher quer ter o gostinho de dizer não para os cafajestes. Por mais que ela queira dizer sim.
Uma mulher quer morrer de rir.
Uma mulher quer que não a levem tão a sério. Quer batalhar por seus ideais sem se embrutecer. Uma mulher quer de vez em quando demonstrar seus dotes de atriz. Uma mulher quer brilhar no escuro.
Uma mulher quer paz. Uma mulher quer ler mais, viajar mais, conhecer mais. Uma mulher quer flores. Quer beijos. Quer se sentir viva. E quer viver pra sempre, enquanto for bom.
Está respondido, doutor Freud. Não somos assim tão complicadas.



quarta-feira, 4 de maio de 2011

Princesas, bandidos e mocinhos-Martha Medeiros

Prefiro mil vezes me deliciar com  as cenas do casamento real que com a realidade sangrenta de todos os dias!



Eu me sinto mais segura pelo fato de Osama bin Laden, o terrorista número 1 do mundo, ter sido assassinado, a despeito de qualquer lei, num acerto de contas entre o bem e o mal. É uma morte com forte simbologia, sem dúvida, e uma tremenda vitória política para os Estados Unidos, mas trata-se de uma desforra, de uma vingança, de um aqui se faz, aqui se paga, e não de um passo efetivo rumo a dias mais pacíficos. Seria, se tivéssemos testemunhado Obama e Osama apertando-se as mãos – uma cena que faz parte do repertório dos delírios, mas que produziria resultados mais práticos.

O rei morreu, viva o rei! Não é sempre assim? O sucessor de Osama bin Laden já deve estar articulando suas pirotecnias para honrar o líder fundamentalista.
Pra quem vê de longe, tudo isso parece enredo de gibi, mocinhos versus bandidos, mas quão distantes ainda estamos do epicentro dos acontecimentos?
Semana passada vi no jornal os destroços de um bar em Marrakesh que foi pelos ares matando quase duas dezenas de turistas. Um ano e meio atrás, eu estava sentada naquele mesmo local. Não é uma sensação confortável, assim como tampouco me sinto 100% tranquila sendo passageira da United Airlines nos próximos dias – viajarei com minha filha justamente para Honolulu, cidade natal do presidente americano, como consta em sua tão anunciada certidão de nascimento.
Ficar em casa seria uma atitude mais cautelosa? Creio que não há segurança garantida nem em casa, nem na escola, nem no trânsito, nem no estádio, nem no bistrô da esquina. Os imprevistos nos alcançam onde quer que estejamos.
Enquanto todos nós estivermos à mercê de fanáticos religiosos, de milícias terroristas e de políticos vorazes pelo poder – citando apenas os peixes graúdos –, o mundo continuará em constante ameaça. É por essas e outras que o ritual monárquico envolvendo dois belos jovens atraiu a atenção de tanta gente. Foi pausa para descanso.
Um olhar rápido para o picadeiro não corrompe a consciência de ninguém. Não é toda hora que se é agraciado com uma dose generosa de fantasia, glamour e humor – eu, ao menos, acho engraçado que se chame de “casamento real” um enlace tão, tão onírico, tão... irreal.
A realeza não sangra, mas a realidade, sim. A paz que podemos alcançar hoje é a interior, individual, porque a paz coletiva é uma ilusão. Todas as nações têm batalhas a vencer – o Brasil tem as suas, os Estados Unidos têm as deles, o Paquistão, a Líbia.
A própria Inglaterra logo, logo será convocada a recolocar os pés no chão. Podemos até preferir seguir enxergando a vida como se ela fosse uma história em quadrinhos: ora um conto de fadas, ora um bague-bangue na favela, ora uma aventura de super-heróis. Mas, pelo menos no que se refere às questões de segurança mundial, já nada me parece tão fictício.

terça-feira, 3 de maio de 2011

OUTROS ESTRANGEIRISMOS-Martha Medeiros

De que adianta andarmos vestidos mas com a bunda de fora?Antes de tudo vamos aprender a falar e escrever direito nosso próprio idioma.





Gosto muito do que voçê escreve. Se não for encômodo, poderia ler o meu blog?
Estou anciosa para ler seu novo livro.
Essas três primeiras frases são exemplos de manifestações carinhosas que recebo diariamente e que muito me comovem, mas, se você reparar bem, vai ver que elas trazem alguns “estrangeirismos” à língua portuguesa, com os quais, aliás, o governo não se importa tanto.
Você escrito com cedilha. Encômodo em vez de incômodo. Anciosa em vez de ansiosa. Equívocos campeões de audiência. Existe também na linguagem escrita uma farta distribuição de palavras como previlégio, viajem, recompença, análize, sem contar os clássicos mendingo, menas, imbigo.
Quando se trata da palavra falada, é comum ouvir “trusse” em vez de trouxe, “eu soo” em vez de “eu suo”, sem falar no descaso absoluto com os plurais: vou com quatro amigo, ela me deve cinco real, almocei dois pastel.
Serão todos analfabetos? De forma alguma. São profissionais liberais, estudantes de faculdade e, olha, alguns se apresentam até como professores. Erram porque todo mundo erra, assim como eu também cometo meus erros. Não esses, nem tantos, mas cometo. Recentemente passei pelo vexame de escrever “doentis” em vez de “doentios”. O português é uma língua que convida à derrapagem.
Só há uma maneira de barrar o uso disseminado desses estrangeirismos no nosso idioma: incentivando cada vez mais o hábito da leitura, investindo maciçamente nas escolas e inaugurando uma biblioteca pública em cada esquina.
Se não for assim, os pais continuarão falando errado em casa e darão maus exemplos aos seus filhos, que por sua vez passarão adiante atrocidades como “para mim fazer” ou “vou estar fechando a loja”, e o português continuará sendo infestado de expressões que, essas sim, comprometem a integridade do nosso idioma.
Eu sou contra qualquer patrulha, mas se querem instaurar uma, que seja pela preservação do bom português, em vez de perderem tempo com uma caça às bruxas improdutiva. A absorção de palavras estrangeiras é algo natural em qualquer cultura, não há motivo para organizar uma resistência.
Claro que há certos exageros, principalmente no jargão empresarial, mas isso é questão de gosto: na minha opinião, de mau gosto. Me parece mais elegante apresentar um orçamento do que um budget, fazer uma reunião do que fazer um meeting e apresentar um relatório em vez de um paper, mas há quem se sinta um profissional mais competente falando assim. Afetação, só isso. De forma alguma coloca em risco nossa língua mãe.
Utilizar palavras em inglês, vez que outra, é apenas uma rendição ao que se consagrou como universal. Não mata ninguém. E não deixa de ser didático, afinal, o turismo tem aumentado no mundo e é bom que se saibam algumas palavras-chaves. De minha parte, acho preferível fazer um happy hour do que ter uma hora felis com os amigos, fazer um check in no aeroporto do que uma xecagem, executar downloads do que baichar músicas. O uso eventual do inglês (ou do francês, do italiano, do latim) não compromete em nada o nosso idioma. O português mal falado e mal escrito é que nos faz passar vergonha.

Entre pendrives e blutufe...

Que coisa,não é? A gente tem "blutufe" e nem sabe... mas também...tanto faz...


Acho que o bom Deus não vai me perguntar se minha entrada é USB, quando eu chegar lá....


Haroldo tirou o papel do bolso, conferiu a anotação e perguntou à balconista:

- Moça, vocês têm pendrive?

- Temos, sim.

- O que é pendrive? Pode me esclarecer? Meu filho me pediu para comprar um.

- Bom, pendrive é um aparelho em que o senhor salva tudo o que tem no computador.

- Ah, como um disquete...

- Não. No pendrive o senhor pode salvar textos, imagens e filmes. O disquete, que nem existe mais, só salva texto.

- Ah, tá bom. Vou querer.

- Quantos giga?

- Hein?

- De quantos giga o senhor quer o seu pendrive?

- O que é giga?

- É o tamanho do pen.

- Ah, tá. Eu queria um pequeno, que dê para levar no bolso sem fazer muito volume.

- Todos são pequenos, senhor. O tamanho, aí, é a quantidade de coisas que ele pode arquivar.

- Ah, tá. E quantos tamanhos têm?

- Dois, quatro, oito, dezesseis giga...

- Hmmmm, meu filho não falou quantos giga queria.

- Neste caso, o melhor é levar o maior.

- Sim, eu acho que sim. Quanto custa?

- Bem, o preço varia conforme o tamanho. A sua entrada é USB?

- Como?

- É que para acoplar o pen no computador, tem que ter uma entrada compatível.

- USB não é a potência do ar condicionado?

- Não, aquilo é BTU.

- Ah! É isso mesmo. Confundi as iniciais. Bom, sei lá se a minha entrada é USB.

- USB é assim ó: com dentinhos que se encaixam nos buraquinhos do computador. O outro tipo é este, o P2, mais tradicional, o senhor só tem que enfiar o pino no buraco redondo. O seu computador é novo ou velho? Se for novo é USB, se for velho é P2.

- Acho que o meu tem uns dois anos. O anterior ainda era com disquete. Lembra do disquete? Quadradinho, preto, fácil de carregar, quase não tinha peso. O meu primeiro computador funcionava com aqueles disquetes do tipo bolacha, grandões e quadrados. Era bem mais simples, não acha?

- Os de hoje nem têm mais entrada para disquete.. Ou é CD ou pendrive.

- Que coisa! Bem, não sei o que fazer. Acho melhor perguntar ao meu filho.

- Quem sabe o senhor liga pra ele?

- Bem que eu gostaria, mas meu celular é novo, tem tanta coisa nele que ainda não aprendi a discar.

- Deixa eu ver. Poxa, um Smarthphone! Este é bom mesmo! Tem Bluetooth, woofle, brufle, trifle, banda larga, teclado touchpad, câmera fotográfica, flash, filmadora, radio AM/FM, TV digital, dá pra mandar e receber e-mail, torpedo direcional, micro-ondas e conexão wireless....

- Blu... Blu... Blutufe? E micro-ondas? Dá prá cozinhar com ele?

- Não senhor. Assim o senhor me faz rir. É que ele funciona no sub-padrão, por isso é muito mais rápido.

- Pra que serve esse tal de blutufe?

- É para um celular comunicar com outro, sem fio.

- Que maravilha! Essa é uma grande novidade! Mas os celulares já não se comunicam com os outros sem usar fio? Nunca precisei fio para ligar para outro celular. Fio em celular, que eu saiba, é apenas para carregar a bateria...

- Não, já vi que o senhor não entende nada, mesmo. Com o Bluetooth o senhor passa os dados do seu celular para outro, sem usar fio. Lista de telefones, por exemplo.

- Ah, e antes precisava fio?

- Não, tinha que trocar o chip.

- Hein? Ah, sim, o chip. E hoje não precisa mais chip...

- Precisa, sim, mas o Bluetooth é bem melhor.

- Legal esse negócio do chip. O meu celular tem chip?

- Momentinho... Deixa eu ver... Sim, tem chip.

- E faço o quê, com o chip?

- Se o senhor quiser trocar de operadora, portabilidade, o senhor sabe.

- Sei, sim, portabilidade, não é? Claro que sei. Não ia saber uma coisa dessas, tão simples? Imagino, então que para ligar tudo isso, no meu celular, depois de fazer um curso de dois meses, eu só preciso clicar nuns duzentos botões...

- Nããão! É tudo muito simples, o senhor logo apreende. Quer ligar para o seu filho? Anote aqui o número dele. Isso. Agora é só teclar, um momentinho, e apertar no botão verde... pronto, está chamando.

Haroldo segura o celular com a ponta dos dedos, temendo ser levado pelos ares, para um outro planeta:

- Oi filhão, é o papai. Sim. Me diz, filho, o seu pen drive é de quantos... Como é mesmo o nome? Ah, obrigado, quantos giga? Quatro giga está bom? Ótimo. E tem outra coisa, o que era mesmo? Nossa conexão é USB? É? Que loucura. Então tá, filho, papai está comprando o teu pen drive. De noite eu levo para casa.

- Que idade tem seu filho?

- Vai fazer dez em março.

- Que gracinha...

- É isso moça, vou levar um de quatro giga, com conexão USB.

- Certo, senhor. Quer para presente?



Mais tarde, no escritório, examinou o pendrive, um minúsculo objeto, menor do que um isqueiro, capaz de gravar filmes! Onde iremos parar? Olha, com receio, para o celular sobre a mesa. "Máquina infernal", pensa. Tudo o que ele quer é um telefone, para discar e receber chamadas. E tem, nas mãos, um equipamento sofisticado, tão complexo que ninguém que não seja especialista ou tenha a infelicidade de ter mais de quarenta, saberá compreender.



Em casa, ele entrega o pen drive ao filho e pede para ver como funciona. O garoto insere o aparelho e na tela abre-se uma janela. Em seguida, com o mouse, abre uma página da internet, em inglês. Seleciona umas palavras e um 'heavy metal' infernal invade o quarto e os ouvidos de Haroldo. Um outro clique e, quando a música termina, o garoto diz:

- Pronto, pai, baixei a música. Agora eu levo o pendrive para qualquer lugar e onde tiver uma entrada USB eu posso ouvir a música. No meu celular, por exemplo.

- Teu celular tem entrada USB?

- É lógico. O teu também tem.

- É? Quer dizer que eu posso gravar músicas num pen drive e ouvir pelo celular?

- Se o senhor não quiser baixar direto da internet...

Naquela noite, antes de dormir, deu um beijo em Clarinha e disse:

- Sabe que eu tenho Blutufe?

- Como é que é?

- Blutufe. Não vai me dizer que não sabe o que é?

- Não enche, Haroldo, deixa eu dormir.

- Meu bem, lembra como era boa a vida, quando telefone era telefone, gravador era gravador, toca-discos tocava discos e a gente só tinha que apertar um botão, para as coisas funcionarem?

- Claro que lembro, Haroldo. Hoje é bem melhor, né?

- Várias coisas numa só, até Blutufe você tem. E conexão USB também.

- Que ótimo, Haroldo, meus parabéns.

- Clarinha, com tanta tecnologia a gente envelhece cada vez mais rápido. Fico doente de pensar em quanta coisa existe, por aí, que nunca vou usar.

- Ué? Por quê?

- Porque eu recém tinha aprendido a usar computador e celular e tudo o que sei já está superado.

- Por falar nisso temos que trocar nossa televisão.

- Ué? A nossa estragou?

- Não. Mas a nossa não tem HD, tecla SAP, slowmotion e reset.

- Tudo isso?

- Tudo.

- A nova vai ter blutufe?

- Boa noite, Haroldo, vai dormir que eu não aguento mais...

(autor desconhecido)

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Non sense...ou melhor..sem noção!!!



Li no jornal: O Deputado Federal Aldo Rabello, líder do novíssimo Partido Comunista, está fazendo um projeto de lei para proibir o uso, por escrito, de palavras estrangeiras no Brasil.


Idéia magistral, como é que não pensei nisso antes? Como é que outros deputados e senadores não pensaram nisso antes, neste país? Há quinhentos e onze anos o Brasil vem incorporando essas horrorosas palavras em inglês, francês, alemão, japonês, italiano, causando gravíssimos danos à função social da língua portuguesa e ninguém fez nada!
Como se sabe, a língua pátria é condição necessária para a formação de uma nação. Entretanto, ao longo dos séculos, invasores de língua querem retirar nossa identidade, introduzindo solertemente suas estrangeiras palavras em nossos textos, abalando de forma radical o nosso nacionalismo que, finalmente, graças aos ideais comunistas do ínclito deputado, será doravante salvo.
Imaginem a alegria que sentiremos nós, brasileiros, quando formos proibidos de escrever Internet, substituindo o terrível termo pelo brasileiríssimo Entre a Rede.
O Twitter será eliminado, pois não há palavra para ele, em português.
E-mail? Minha querida, recebeste a correspondência eletrônica que te enviei ontem?
Você nunca mais manejará um mouse e terá, para todo o sempre, um camundongo em sua mão.
O locutor não gritará o horrendo gol, que será substituído por... por ‘a esfera ingressou na área posterior às traves e o travessão’.
Sua casa não terá mais ladrilhos e sim pequenos pedacinhos de pedra colorida.
E isto que estou simplificando, há situações muito mais complexas que o nacionalismo deve proteger à todo o custo, quando se trata de defender a língua mãe.
Ai de quem se atrever a digitar marqueting no trabalho de conclusão de concurso. Um bom e verdadeiro brasileiro substituirá a palavra alienígena por algo bem mais simples, como ‘a estrutura de divulgação, interação, empatia e divulgação das atividades mercadológicas visando dar conhecimento de produtos e atividades específicas ou gerais’.
Se um escritor como eu descrever a despedida de seu personagem francês com um ‘au revoir’, será imediatamente preso!
E não tomarei mais seu tempo com exemplos. Passo a identificar a motivação que levou o parlamentar à conceber um absurdo tamanho.
A primeira coisa que me ocorre é que ele não tem mais nada para pensar. Absolutamente nada. E solidário com seus pares parlamentares, que também não pensam em nada além de negócios rendosos, resolveu ocupar-lhes a mente.
Imagino nossas Casas Legislativas lotadas, em sessões solenes e intermináveis, onde nossas excelências debaterão a matéria à exaustão, estudando, vernáculo a vernáculo, o que pode e o que não pode ser escrito neste país.
Pense nos puristas parlamentares, exultantes com o debate, revelando seu extraordinário pensamento, as linhas de raciocínio, os apartes pro bono (acabo de me arriscar, escrevendo em latim), os a favor, os contra, um espetáculo brasileiro de democracia, não importa que a corrupção corra solta e que mais de sete mil pessoas trabalhem para oitenta senadores, ganhando o salário pagos por nós, que odiamos palavras estrangeiras escritas por incultos professores, artistas, jornalistas, poetas, escritores, filósofos e outros entreguistas que assolam a Nação.
Perceba a grandeza do projeto!
Outro motivo que pode ter levado o velho Aldo à conceber a coisa pode ser a arteriosclerose, palavra que nem sei se brasileira é.
Imaginando-se, por confusão mental, estar sob a influência (ou domínio) do Império Romano e percebendo que o Latim virou latim vulgar, aquele falado nos países conquistados, misturados com as línguas pátrias, entrou em crise de nervos.
Esquecendo-se de que o Português deriva do latim vulgar, quer o nobre que preservemos, como se fôssemos uma raça, a pureza absoluta, abolindo da nossa escrita tudo aquilo que não for contemplado na língua de Virgilio.
“Mensalão”, por exemplo, é permitido?
Você, garota, jamais seja fashion. Arrisca-se aos piores rigores da lei.
Enfim!
Um país como o nosso, sem problemas, onde as instituições funcionam como um relógio suíço, a honestidade é absoluta, escândalos não existem, crimes não são cometidos, a segurança é perfeita, as estradas são ótimas, a educação é a melhor do mundo, a Saúde Pública é maravilhosa, o sistema político é exemplar, o problema social não existe e a riqueza é distribuída com absoluta justiça, tem mesmo é que se preocupar com palavras estrangeiras.
Eu, olhando aqui debaixo, já estou me preparando para nunca mais escrever non sense. Corro o risco de ser condenado a não sei quantos anos de prisão.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Falando de sofá e não do divã



Quarta-feira, dia oficial do sofá! Alguém lembra?Pergunte a um rapaz ou uma moça de 20 anos por que quarta-feira é o dia chamado “dia do sofá”. Agora pergunte a um homem ou uma mulher de 40 anos. Os últimos, sorrindo, responderão pelo que lhes parece óbvio: “é..., bem... era o dia oficial do namoro, do pegar na mão, abraços e carícias permitidas no sofá da sala, enquanto os pais fingiam ir dormir mais cedo”. Mas já os rapazes de hoje dirão: “Dãaaa, (significando óbvio), é dia de assistir ao futebol e torcer pro time do coração, é sofá ou estádio”. Junta-se a galera, sai um churrasquinho, cervejinha. Namoro, namorada/o? Hã? Que isso? A única idéia de abraçar alguém é quando sai gol e não importa sexo, mentiras nem “Rock´n Roll” e sim se a pessoa ao lado está torcendo pro mesmo time.

O que aconteceu com a quarta-feira, com o dia da semana tão esperado  do “sofá”?
Vamos nos reportar a comédia romântica chamada “Scream & Yell” ou em português “Amor em Jogo”, baseado no livro Fever Pitch (Febre de Bola), que mostra bem essa produção cultural narcísica da nossa sociedade que coloca o futebol e seus jogadores como ídolos representantes da maior prova de afeto dirigida ao outro.
Ganhando milhões ou apenas uns 200 mil por mês, estão lá, “nossos” heróis dando a cara e o resto do corpo pra entreter a massa e ocupar o lugar deixado vazio por nossos amantes. Afinal, o que atraí mais? Uma relação de paixão com o time-herói, que na ordem de nossa identificação nos faz sentir vitoriosos, sem demandar “trabalho” nenhum para agradar o outro? Ou uma relação aonde as duas pessoas implicadas vem com suas diferenças cujo encontro nem sempre garante um prazer absoluto tal qual o conforto do sofá em frente a mega TV digital regada a uma ou duas, ou três, ou mais anestésicas cervejinhas para o caso do timão ter que ser perdoado?
Saudades das quartas-feiras...

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Choro pelas crianças interrompidas...



Choro pelos pais. Choro pelas crianças que mal começavam e foram interrompidas. Choro pelos parentes, irmãos, amigos. Choro pela desgraça e pela tragédia da escola, no Rio de Janeiro. Choro sem lágrimas, um choro interno, um choro da alma que, já empedernida, recusa-se a suar, não são as lágrimas o suor da alma?

Choro forte desta vez, pois o choro diário, quando morrem em acidentes de trânsito, em atentados terroristas, em tsunamis e terremotos, assaltos ou devido às drogas, é um choro amortecido pela constância e pelo medo de que a tragédia aconteça comigo ou próximo a mim.
Entender o ser humano sempre foi um esforço, uma busca que não terá fim. Porém ouso considerar que as doenças mentais podem ser divididas em patologias apenas psíquicas e patologias psíquicas racionais.
O assassino do Rio de Janeiro não tinha alternativa e faria o que fez de qualquer modo. Sua loucura é incontrolável, ele não possuía nenhum domínio sobre ela e assim submetido, seguiu em frente, dando vazão ao impulso doentio. Esquizofrenia talvez seja a denominação adequada à sua doença.Outras do mesmo gênero são a cleptomania, a pedofilia, a paranóia, a bipolaridade, doenças que dominam e controlam o sujeito que sobre elas não possuem qualquer controle, qualquer domínio.
Para os atos que esses doentes praticam, não há perdão, mas também não há condenação. Devem estar sob constante vigilância e tratamento que reduzam os impulsos e impeçam as tragédias.
Nem sempre é possível.
As doenças psíquicas racionais são aquelas em que o indivíduo opta pela ação que vai praticar, embora possua arcabouço mental para escolher o oposto, isto é, não fazer o que o impulso determina.
O fanatismo é uma doença mental racional, o sujeito escolhe submeter-se à sua obsessão e agir de acordo com ela.
Terroristas, racistas, homofóbicos, intolerantes de todo o gênero são doentes mentais racionais porque, ao invés de utilizar a razão para o benefício da humanidade, raciocinam em favor do próprio fanatismo.
O homem-bomba que explode um supermercado, um aeroporto ou um avião, age em nome de uma causa que ele, fanaticamente, segue. Não admite, racionalmente, rever suas idéias, encarar distorções evidentes, modificar seus conceitos. Assim, age em plena posse de suas faculdades mentais.
E todos aqueles que apóiam o procedimento são, igualmente, doentes mentais racionais, que minimizam a morte, a destruição e o desespero alheio, em nome do valor mais elevado: a causa que defendem.
Todo ditador, não importa a ideologia, é um doente mental racional.
Quando um esquizofrênico atira e mata indiscriminadamente, está respondendo aos impulsos da própria mente adoecida, ao comando de vozes inexistentes, mas que para ele, existem. É tão intensa a doença que, quase sempre, são suicidas, como se um pequeno espaço saudável de sua mente exigisse a auto punição imediata.
Quando um terrorista ou um ditador mata indiscriminadamente, está obedecendo a um raciocínio lógico que sua mente adoecida constrói, mas sobre o qual possui amplo domínio e plena capacidade para elaborar o raciocínio inverso. Trata-se, neste caso, de uma escolha consciente pela destruição.
Os doentes mentais racionais não merecem perdão, merecem o pior castigo possível, merecem a extirpação e a execração. Os outros, os verdadeiros doentes mentais, merecem a nossa piedade e compreensão.
O assassino do Rio de Janeiro fez justiça com as próprias mãos ao disparar a arma contra a própria cabeça.
Encerro chorando sem lágrimas, mas com a alma dorida e triste por saber que somos todos seres humanos, quando podíamos ser apenas humanos.
E sigo a vida como ela pode ser seguida, sem esperanças e com medo.(paulo wainberg)

terça-feira, 5 de abril de 2011

Devaneios etcétera e tal...: Amar-verbo intransitivo

Devaneios etcétera e tal...: Amar-verbo intransitivo: "Procure me amar quando eu menos merecer, porque é quando eu mais preciso!(Ana Jácomo) Falamos à beça de amor. Apesar das nossas singular..."

Amar-verbo intransitivo


Procure me amar quando eu menos merecer, porque é quando eu mais preciso!(Ana Jácomo)



Falamos à beça de amor. Apesar das nossas singularidades, temos pelo menos esse desejo em comum: queremos amar e ser amados. Amados, de preferência, com o requinte da incondicionalidade. Na celebração das nossas conquistas e na constatação dos nossos fracassos. No apogeu do nosso vigor e no tempo do nosso abatimento. No momento da nossa alegria e no alvorecer da nossa dor. Na prática das nossas virtudes e no embaraço das nossas falhas. Mas não é preciso viver muito para percebermos nos nossos gestos e nos alheios que não é assim que costuma acontecer.

Temos facilidade para amar o outro nos seus tempos de harmonia. Quando realiza. Quando progride. Quando sua vida está organizada e seu coração está contente. Quando não há inabilidade alguma na nossa relação. Quando ele não nos desconcerta. Quando não denuncia a nossa própria limitação. A nossa própria confusão. A nossa própria dor. Fácil amar o outro aparentemente pronto. Aparentemente inteiro. Aparentemente estável. Que quando sofre não faz ruído algum.

Fácil amar aqueles que parecem ter criado, ao longo da vida, um tipo de máscara que lhes permite ter a mesma cara quando o time ganha e quando o cachorro morre. Fácil amar quem não demonstra experimentar aqueles sentimentos que parecem politicamente incorretos nos outros, embora costumem ser justificáveis em nós. Fácil amar quando somos ouvidos mais do que nos permitimos ouvir. Fácil amar aqueles que vivem noites terríveis, mas na manhã seguinte se apresentam sem olheiras, a maquiagem perfeita, a barba atualizada.

É fácil amar o outro na mesa de bar, quando o papo é leve, o riso é farto, e o chope é gelado. Nos cafés, após o cinema, quando se pode filosofar sobre o enredo e as personagens com fluência, um bom cappuccino e pão de queijo quentinho. Nos corredores dos shoppings, quando se divide os novos sonhos de consumo, imediato ou futuro. É fácil amar o outro nas férias de verão, no churrasco de domingo, nos encontros erotizados, nas festas agendadas no calendário do de vez em quando.

Difícil é amar quando o outro desaba. Quando não acredita em mais nada. E entende tudo errado. E paralisa. E se vitimiza. E perde o charme. O prazo. A identidade. E fala o tempo todo do seu drama com a mesma mágoa. Difícil amar quando o outro fica cada vez mais diferente do que habitualmente ele se mostra ou mais parecido com alguém que não aceitamos que ele esteja. Difícil é permanecer ao seu lado quando parece que todos já foram embora. Quando as cortinas se abrem e ele não vê mais ninguém na plateia. Quando até a própria alma parece haver se retirado.

Difícil é amar quando já não encontramos motivos que justifiquem o nosso amor, acostumados que estamos a achar que o amor precisa estar sempre acompanhado de explicação. Difícil amar quando parece existir somente apesar de. Quando a dor do outro é tão intensa que a gente não sabe o que fazer para ajudar. Quando a sombra se revela e a noite se apresenta muito longa. Quando o frio é tão medonho que nem os prazeres mais legítimos oferecem algum calor. Quando ele parece ter desistido principalmente dele próprio.

Difícil é amar quando o outro nos inquieta. Quando os seus medos denunciam os nossos e põem em risco o propósito que muitas vezes alimentamos de não demonstrar fragilidade. Quando a exibição das suas dores expõe, de alguma forma, também as nossas, as conhecidas e as anônimas. Quando o seu pedido de ajuda, verbalizado ou não, exige que a gente saia do nosso egoísmo, do nosso sossego, da nossa rigidez, para caminhar ao seu encontro.

Difícil é amar quando o outro repete o filme incontáveis vezes e a gente não aguenta mais a trilha sonora. Quando se enreda nos vícios da forma mais grosseira e caminha pela vida como uma estrela doída que ignora o próprio brilho. Quando se tranca na própria tristeza com o aparente conforto de quem passa um feriadão à beira-mar. Quando sua autoestima chega a um nível tão lastimável que, com sutileza ou não, afasta as pessoas que acreditam nele. Quando parece que nós também estamos incluídos nesse grupo.

Difícil é amar quem não está se amando. Mas esse talvez seja o tempo em que o outro mais precise se sentir amado. Para entender, basta abrirmos os olhos para dentro e lembrar das fases em que, por mais que quiséssemos, também não conseguíamos nos amar.
 A empatia pode ser uma grande aliada do amor.

quarta-feira, 23 de março de 2011

Como parecer bem mais velha.(Glorinha Kalil)


Prolongar a imagem dos tempos da juventude é desafio para a maioria das mulheres.
Um dos segredos é trabalhar pesado para manter a silhueta dos vinte e poucos anos, mas prestar atenção para não deixar seu look muito datado também é fundamental.
Existem algumas peças que, mesmo levando em conta o vaivém da moda, derrubam a aparência de qualquer pessoa. Confira a lista de elementos de estilo que podem acrescentar até 10 anos à sua aparência. Mesmo que você goste e continue usando, é bom ficar sabendo:

Pareô amarrado no pescoço (tipo tapa tudo) + chapéu de abas largas na praia.

Tailleur de mangas curtas.

Blusa transparente com sutiã aparente.

Chemisier.

Blusa tipo chemise, de seda ou cetim, com discreto laço no pescoço. Em geral, roupa vintage envelhece. Essa moda é boa para gente jovem!

Blusa ou camisa de SEDA branca ou creme + jeans (se for com sapatilha, então, pior!)

Jeans com cintinhos e sapatos combinando.

Jeans com vinco.

Twin-set tradicional.

Comprimento de saia um palmo abaixo dos joelhos (tipo longuette).

Minissaia depois dos 40 complica (mesmo que você tenha pernas maravilhosas).

Meias de nylon brancas, champagne (dão efeito de perna engessada), ou cor da pele.

Lenços mal amarrados: se não souber amarrar direito, NÃO USE! Não há nada que envelheça mais.

Pérolas tímidas; acessórios miúdos.

Xalinho nas costas.

Rosto empoado. Contorno da boca mais escuro que o batom.

Cabelo fora de moda (10 anos a mais no visual, com certeza).

Cabelos com mechas para disfarçar os brancos (Sinto muito, mas é verdade!).

Conjuntinhos de bolsa e sapato idênticos e de bijuterias ou jóias super combinadinhas.

Óculos de leitura pendurados no pescoço.

Sapatinhos cômodos de salto grosso e baixo.

Sapatos de ótima qualidade, mas com salto e bico fora de moda.

Achar a moda atual “UM HORROR”.

Ter pânico de eletrônicos e de tecnologia.

Lembrar quem matou Odete Roitman!
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P.S Glorinha sabe das coisas.Esta última foi ótima!kkkk

segunda-feira, 21 de março de 2011

O bom portugês se fala (ou se escreve) assim...





-Alguém sabe me explicar, num português claro e direto, sem figuras de linguagem, o que quer dizer a expressão "no frigir dos ovos"?

-Quando comecei, pensava que escrever sobre comida seria sopa no mel, mamão com açúcar. Só que depois de um certo tempo dá crepe, você percebe que comeu gato por lebre e acaba ficando com uma batata quente nas mãos. Como rapadura é doce mas não é mole, nem sempre você tem idéias e pra descascar esse abacaxi só metendo a mão na massa.
E não adianta chorar as pitangas ou, simplesmente, mandar tudo às favas.
Já que é pelo estômago que se conquista o leitor, o negócio é ir comendo o mingau pelas beiradas, cozinhando em banho-maria, porque é de grão em grão que a galinha enche o papo.
Contudo é preciso tomar cuidado para não azedar, passar do ponto, encher linguiça demais. Além disso, deve-se ter consciência de que é necessário comer o pão que o diabo amassou para vender o seu peixe. Afinal não se faz uma boa omelete sem antes quebrar os ovos.
Há quem pense que escrever é como tirar doce da boca de criança e vai com muita sede ao pote. Mas como o apressado come cru, essa gente acaba falando muita abobrinha, são escritores de meia tigela, trocam alhos por bugalhos e confundem Carolina de Sá Leitão com caçarolinha de assar leitão.
Há também aqueles que são arroz de festa, com a faca e o queijo nas mãos, eles se perdem em devaneios (piram na batatinha, viajam na maionese... etc.). Achando que beleza não põe mesa, pisam no tomate, enfiam o pé na jaca, e no fim quem paga o pato é o leitor que sai com cara de quem comeu e não gostou.
O importante é não cuspir no prato em que se come, pois quem lê não é tudo farinha do mesmo saco. Diversificar é a melhor receita para engrossar o caldo e oferecer um texto de se comer com os olhos, literalmente.
Por outro lado se você tiver os olhos maiores que a barriga o negócio desanda e vira um verdadeiro angu de caroço. Aí, não adianta chorar sobre o leite derramado porque ninguém vai colocar uma azeitona na sua empadinha, não. O pepino é só seu, e o máximo que você vai ganhar é uma banana, afinal pimenta nos olhos dos outros é refresco...
A carne é fraca, eu sei. Às vezes dá vontade de largar tudo e ir plantar batatas. Mas quem não arrisca não petisca, e depois quando se junta a fome com a vontade de comer as coisas mudam da água pro vinho.
Se embananar, de vez em quando, é normal, o importante é não desistir mesmo quando o caldo entornar. Puxe a brasa pra sua sardinha, que no frigir dos ovos a conversa chega na cozinha e fica de se comer rezando. Daí, com água na boca, é só saborear, porque o que não mata engorda.
Entendeu o que significa “no frigir dos ovos”? (eu rindo aqui..)

quinta-feira, 17 de março de 2011

Os gaúchos-Arnaldo Jabor




O Rio Grande do Sul é como aquele filho que sai muito diferente do resto da família. A gente gosta, mas estranha. O Rio Grande do Sul entrou tarde no mapa do Brasil . Até o começo do século XIX, espanhóis e portugueses ainda se esfolavam para saber quem era o dono da terra gaúcha. Talvez por ter chegado depois, o Estado ficou com um jeito diferente de ser.

Começa que diverge no clima: um Brasil onde faz frio e venta, com pinheiros em vez de coqueiros, é tão fora do padrão quanto um Canadá que fosse à praia. Depois, tem a mania de tocar sanfona, que lá no RS chamam de gaita, e de tomar mate em vez de café. Mas o mais original de tudo é a personalidade forte do gaúcho. A gente rigorosa do sul não sabe nada do riso fácil e da fala mansa dos brasileiros do litoral, como cariocas e baianos. Em lugar do calorzinho da praia, o gaúcho tem o vazio e o silêncio do pampa, que precisou ser conquistado à unha dos espanhóis.

Há quem interprete que foi o desamparo diante desses abismos horizontais de espaço que gerou, como reação, o famoso temperamento belicoso dos sulinos.

É uma teoria - mas conta com o precioso aval de um certo Analista de Bagé, personagem de Luis Fernando Veríssimo que recebia seus pacientes de bombacha e esporas, berrando: "Mas que frescura é essa de neurose, tchê?"

Todo gaúcho ama sua terra acima de tudo e está sempre a postos para defendê- la.

Mesmo que tenha de pagar o preço em sangue e luta.

Gaúcho que se preze já nasce montado no bagual (cavalo bravo). E, antes de trocar os dentes de leite, já é especialista em dar tiros de laço. Ou seja, saber laçar novilhos à moda gaúcha, que é diferente da jeito americano, porque laço é de couro trançado em vez de corda, e o tamanho da laçada, ou armada, é bem maior, com oito metros de diâmetro, em vez de dois ou três.

Mas por baixo do poncho bate um coração capaz de se emocionar até as lágrimas em uma reunião de um Centro de Tradições Gaúchas, o CTG, criados para preservar os usos e costumes locais.

Neles, os durões se derretem: cantam, dançam e até declamam versinhos em honra da garrucha, da erva-mate e outros gauchismos. Um dos poemas prediletos é "Chimarrão", do tradicionalista Glauco Saraiva, que tem estrofes como: "E a cuia, seio moreno/que passa de mão em mão/traduz no meu chimarrão/a velha hospitalidade da gente do meu rincão." (bem, tirando o machismo do seio moreno, passando de mão em mão, até que é bonito).

Esse regionalismo exacerbado costuma criar problemas de imagem para os gaúchos, sempre acusados de se sentir superiores ao resto do País.

Não é verdade - mas poderia ser, a julgar por alguns dados e estatísticas.

O Rio Grande do Sul é possuidor do melhor índice de desenvolvimento humano do Brasil, de acordo com a ONU, do menor índice de analfabetismo do País, segundo o IBGE e o da população mais longeva da América Latina, (tendo Veranópolis a terceira cidade do mundo em longevidade), segundo a Organização Mundial da Saúde. E ainda tem as mulheres mais bonitas do País, segundo a Agência Ford Models. (eu já sabia!!!rss) Além do gaúcho, chamado de machista", qual outro povo que valoriza a mulher a ponto de chamá-la de prenda (que quer dizer algo de muito valor)?

Macanudo, tchê. Ou, como se diz em outra praças: "legal às pampas", uma expressão que, por sinal, veio de lá.

Aos meus amigos gaúchos e não gaúchos, um forte abraço!



segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Devaneios.

Um vento bate e levanta papeis imóveis na mesa. No mesmo momento o pensamento desarruma as idéias prontas. Divide as partes de uma crença, separa cores primárias de uma pintura. Derruba estrelas do céu na boca. Me faz andar sem querer sair. E vejo aquilo que eu não precisava. E lembro daquilo que eu nem vivi. Uma alegria nova. Essa pessoa antiga. Já vejo mais. E os outros também. Aponto pra cima. Nem imagino, mas tenho sido aquela. Que nem dormia em mim...e agora me devora.




Pinta no céu um sono. E implora sonhos.

Fui buscar no azul um brilho. Viajei nas caldas pela promessa do encontro.
Ouvi desejos do novo dia. Fiz deitar corpos numa longa estrada. A minha alma renovou os votos. Sua mente descansa. Beija a noite numa boa. Eu imagino um pouco de tudo.
E você, fecha os olhos antes que chegue um bicho.


"Nada jamais me será prometido senão eu mesma, e este eu-mesma, não será nada, se eu nada tiver o que fazer de mim"

Simone de Beauvoir

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Cisne Negro.Negro?



Darren Aronofsky tem uma carreira impecável :A Fonte da Vida (2006) , Réquiem para Um Sonho (2000) e seu penúltimo filme O Lutador ( 2008).Em Cisne negro, não é diferente dos anteriores.

Natalie Portman faz Nina, uma bailarina obcecada pelo papel duplo no famoso balé O Lago dos Cisnes, de Tchaikovsky. Entretanto, seu jeito de menina casta e superprotegida pela mãe (uma bailarina frustrada) se vê na obrigação de assumir uma personalidade oposta à sua para ser escolhida no espetáculo que exige que ela assuma não apenas o seu lado “cisne branco” que condiz mais com ela com seu aspecto de menina bem comportada, como também o seu antagonista, o tal “cisne negro” do título( sexualizada e má). No entanto, esta pressão faz com que ela libere algo que está acima do seu controle e conheça partes obscuras de seu íntimo  em nome da perfeição artística.
Nina é uma mulher presa a um cotidiano que não permite que ela amadureça impedindo o natural desenvolvimento da sua própria sexualidade, obcecada pela sua carreira de bailarina e enclausurada no universo claustrofóbico que sua mãe criou em torno dela. Seu quarto ainda é o típico quarto de uma menina, com bonecas e bichinhos de pelúcia (interessante a parte do filme em que ela coloca no lixo todos eles).
A sufocante presença da mãe aparece (dentre outras coisas) pela imposição de portas sempre destrancadas do quarto e banheiro da filha impedindo com isto uma real privacidade da menina. E se de um lado sua mãe a mantêm como uma eterna criança, inocente e submissa( sweet), por outro o diretor do balé tenta despertar a mulher presa dentro de Nina apelando para contatos sexuais, ora com o próprio professor, ora com ela mesma.
Desta forma, o cisne branco e o cisne negro do espetáculo talvez sirvam como metáfora da dualidade conflitante da protagonista e de alguns que assistam ao filme.Um conflito que aumenta ao longo do filme, potencializado pela obsessão da personagem pela perfeição.
O que mais nos aflige no filme é a tal dualidade que todo ser humano tem dentro de si e que por educação ou moral exacerbada  uma sempre irá se sobrepor à outra.
O que achei um erro inadmíssivel  no filme de Darren Aronofsky seria o fato do autor confundir “sensualidade extravasada” como o lado mau e perverso de uma personalidade, criando assim um cisne negro, na minha opinião, retocável.

sábado, 29 de janeiro de 2011

Cansada de mim.






Todos os dias passo por mim, mas nunca me olho. Decerto porque estou cansado de me conhecer, quiçá cansada de mim.
Hoje dei comigo olhos nos olhos e não sei que força me travou o passo. Mas parei e olhei-me e surpreendi-me comigo mesma. De repente, quase tive dúvidas se era eu que estava ali na minha frente, mas logo vi que era.
Há traços, há curvas, diáfanos e imperceptíveis desenhos num rosto que o tempo não logrou desvanecer. Agora tudo é claro, apesar das remotas e profundas marcas do tempo. Marcas que neste instante não vejo, mas estarem vivas em mim, profundas e inapagáveis.
Naquele 'eu' que está na minha frente, está esse outro, eu de há muito, que tenho desconsiderado com a minha indiferença. Nesta hora, estou a gostar de me ver ainda não toldada pelas ditas e inexoráveis marcas. Só não gosto do meu cabelo. Tem a risca ao meio num rasgo quase simétrico, a conferir-me um ar que vaga pelas bandas do caricato. Não, não gosto do meu penteado, desse eu que tenho na minha frente. Mas estou a gostar de me ver, porque olhando-me desde aquele tempo, vejo toda uma vida transbordar de coisas, de acontecimentos, sentimentos, emoções. Eia, tanta coisa se passou comigo neste longo entretanto. Conheci horas felizes, mas conheci a amargura sem limites. Conheci a amizade mas acima de tudo cruzei-me e senti-me devorada pelo amor.
Acho que pela primeira vez e neste preciso instante, tenho consciência do que é o tempo, do que ele faz em nós, da oportunidade que ele nos dá de vivermos, afinal, daquilo que é estar-se vivo, isto é desfrutar da luz da janela da vida.
Você é os brinquedos que brincou, as gírias que usava, você é os nervos a flor da pele no vestibular, os segredos que guardou, você é sua praia preferida, Garopaba, Maresias, Ipanema, você é a renascido depois do acidente que escapou, aquele amor atordoado que viveu, a conversa séria que teve um dia com seu pai, você é o que você lembra.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Devaneios etcétera e tal...: Somos os reis do tapa-buraco.

Devaneios etcétera e tal...: Somos os reis do tapa-buraco.: "Chuva. Nada mais ancestral. Muita água, pouca água, não importa: choverá. Em vários períodos do ano, mais forte, mais fraco: choverá. Em ..."

Somos os reis do tapa-buraco.




Chuva. Nada mais ancestral. Muita água, pouca água, não importa: choverá. Em vários períodos do ano, mais forte, mais fraco: choverá. Em São Paulo, Minas, Rio, Florianópolis. E também na Alemanha, na Nova Zelândia, no Peru.

Choveu nos anos 40, chove em 2011, choverá em 2068. Passado, presente e futuro sob uma única nuvem. Só que o país do futuro não pensa no futuro. Somos totalmente refratários à prevenção.
Tudo o que nos acontece de ruim provoca uma chiadeira, vira escândalo nacional – mas depois. Ficamos estarrecidos, mas depois. O antes é um período de tempo que não existe. Investir dinheiro para evitar o que ainda não aconteceu nos soa como panaquice.
Se está tudo bem até as 14h30min desta quarta-feira, por que acreditar que às 14h31min tudo pode mudar? E então não se investe em hospitais até que alguém morra no corredor, não se policia uma rua até que duas adolescentes sejam estupradas, não se contrata salva-vidas até que meia dúzia morra afogada.
Somos os reis em tapar buracos, os bambambãs em varrer para debaixo do tapete, os retardatários de todas as corridas rumo ao desenvolvimento. Não prevemos nada. Adoramos os astrólogos, mas odiamos pesquisa. Consideramos estupidez gastar dinheiro com tragédias que ainda estão em perspectiva. Só o erro consolidado retém nossa atenção.
A gente se entope de açúcar, não usa fio dental e depois vai tratar a cárie, se sentindo privilegiado por poder pagar um dentista. A gente aplaude a arrogância dos filhos e depois vai pagar a fiança na delegacia. A gente fuma três maços por dia e depois processa a indústria tabagista. A gente corre na estrada a 140 km/h, ultrapassa em faixa contínua e depois suborna o guarda, na melhor das hipóteses. Ou então morre, ou mata – na pior delas.
A gente vota em corrupto, depois desdenha da política em mesa de bar. A gente joga lixo no cordão da calçada, depois se surpreende em ter a rua alagada. A gente se expõe em todas as redes sociais, depois esbraveja contra os que invadiram nossa privacidade.
Precisamos de transporte público de qualidade, mas só depois de sediar a Copa do Mundo. A sociedade reclama por profissionais mais gabaritados, mas ninguém investe em professores e em universidades. E os donos de estabelecimentos comerciais só irão se dar conta de que estão perdendo dinheiro quando descobrirem os manés que contrataram para atender seus clientes. Treinamento antes, não. Se precisar mesmo, depois.
Precisamos mesmo. Só que antes. (M.M)

domingo, 23 de janeiro de 2011

Pedaços de mulher




Quantos pedaços formam uma mulher? Tantos que ela vive inacabada.

Nossos pedaços custam a se encaixar. O epicentro do quebra-cabeça costuma ser a maternidade, um pedaço grande que precisa combinar com o pedaço da luxúria, com o pedaço da solidão e também com aquela partezinha da preguiça, que ninguém avisou que fazia parte do jogo.
Há peças variadas, que vistas separadamente, não têm nada a ver uma com a outra, mas juntas fazem o shazam. O pedaço da submissão que precisava encaixar com o pedaço da rebeldia, o pedaço da juventude que tem que encaixar com o pedaço da menopausa, um pedaço desgarrado que tem que encaixar com o imenso pedaço da nossa árvore genealógica, e vários outros pedaços aparentemente sem combinação: nossa parte homem, nossa parte criança, nossa parte louca, nossa parte santa, nossa parte lúcida, nossa parte conveniente, nossa parte viciada, e mais aquelas desgastadas pelo uso, e umas que se perderam, e outras tão pequenas que ficaram invisíveis. Como encaixar o que não se revela nem para nós mesmas?
Almadóvar filma as mulheres como se elas fossem pizzas de vários sabores. Mezzo freiras, mezzo HIV positivas. Mezzo doces, mezzo apimentadas. Mezzo dramáticas, mezzo divertidas. Almadôvar nunca fecha o quebra cabeça, apenas esparrama na tela os vários pedaços que, unidos, nos transformariam num ser único, e que, uma vez pronto, já não empolgariam ninguém.Daí a importância se haver sempre uma peça faltando, pois é isso que nos mantém acordados, assim no cinema como na vida.

domingo, 16 de janeiro de 2011

O homem que casou com sua mão direita.(L.F.Veríssimo)




A verdade era que Herculano encontrara na sua mão direita o que nunca encontrara numa mulher.

O Herculano era um homem sério, o que tornava suas esquisitices ainda mais divertidas para o grupo. Mesmo quando não estava na roda, o Herculano era assunto da turma. Volta e meia, alguém chegava com uma história nova do amigo, sempre prefaciada com a frase:
– Sabem a última do Herculano?
Pois a última do Herculano ele mesmo anunciou, um dia, ao chegar no bar:
– Pedi a minha mão em casamento.
– O quê?!
– Você vai casar com você mesmo?
– Não, só com a minha mão. Esta.
E Herculano levantou sua mão direita. A noiva abanou para todos na mesa.
Herculano explicou que não tinha sido uma decisão súbita e impensada. Ele e sua mão eram ligados desde pequenos. Tinham se criado juntos. A partir da puberdade haviam começado a fazer sexo regularmente, mas nada sério. Coisa de adolescentes. Com o tempo, no entanto, o relacionamento mudara.
Crescera uma real afeição entre os dois, que aos poucos se transformara em amor. A verdade, contou Herculano, era que encontrara na sua mão direita o que nunca encontrara numa mulher. Além de ser uma companheira constante que jamais o contrariava e fazia todas as suas vontades, era uma amante perfeita. Nenhuma mulher conseguia satisfazê-lo como sua mão direita
– Me apaixonei, pronto – disse Herculano.
Herculano enumerou todas as vantagens de ter sua mão direita como esposa. Ela jamais lhe seria infiel. Ela jamais se recusaria, com um gesto que fosse, a fazer amor com ele. Estaria sempre pronta para o sexo, incapaz de alegar dor de cabeça, tendinite ou o que fosse.
E não esperaria que ele fizesse conversa de neném antes e depois do ato, como algumas mulheres exigem. Sua mão direita não esperaria nada, não exigiria nada, seria uma amante – além de exímia nas artes do amor – silenciosa.
Não era brincadeira. Herculano levou adiante o plano de casar com sua mão direita. Durante algum tempo – o tempo do noivado – a noiva usou duas alianças no seu dedo anular, uma dela e a outra do Herculano. Depois do casamento, a aliança do Herculano passou para a sua mão esquerda. Todos na roda queriam saber quando seria o casamento, quem seriam os padrinhos etc., mas Herculano informou que a cerimônia seria simples e sem testemunhas.
Ele sabia que não seria difícil arranjar alguém para oficializá-la. Hoje em dia, como se sabe, tem até padre casando surfistas em cima da prancha e pegando onda. Mas Herculano preferiu a discrição. A lua de mel foi em Cancun.
E aconteceu uma coisa que ninguém poderia prever. O Herculano, que nunca fora disso, se revelou num grande ciumento. Continua frequentando a roda, mas, se desconfia que alguém está dando muita atenção à sua esposa, põe a mão no bolso.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Não vale a pena ver de novo! Plim plim.




Está chegando aos últimos capítulos a novela Passione, e eu que resolvi assistir quando nos primeiros capítulos vislumbrei aquelas imagens deslumbrantes da Toscana, agora ao final, vejo a perda de tempo que o autor me fez passar junto aos inúmeros brasileiros que fizeram o mesmo que eu.
A coitada da Beth Gouvea( a magnânima Fernanda Montenegro)casou-se grávida de outro homem (Francisco Cuoco) que não o marido( Mauro Mendonça) e teve um filho que o marido corno escondeu na Itália, precisamente em Toscana mentindo para ela que havia morrido no parto.
Não sei se foi revolta dos céus, mas daí em diante todos os filhos legítimos do casal viram cornos sendo que depois até o que era considerado morto e aparece ( Tony Ramos) também fica corno,sem deixar de incluir nesta saga  a filha esquisita do casal que chegou de Paris e para mostar isto passa a novela inteira em roupas futuristas.
Um dos filhos(Marcelo Antony) que nunca aparece trabalhando, tinha um problema misterioso, se falou até em pedofilia,  necrofilia, trouxeram  às cenas o psiquiatra Gikovate para auxiliá-lo e no final da novela, após grandes quebras de computador e suores frente ao mesmo, o problema do moço era gostar de ver cenas trash, ou seja, um voyer com péssimo gosto.
O  filho mais velho, mau caráter, assassinado pela metade da novela, ex-presidente da fábrica, que chamaremos de malandro agulha (aquele que toma na bunda mas não perde a linha...) odiava a mãe, alem da mulher que não comia , sendo que esta(Maitê Proença) saía à  tarde pelas ruas do Rio a “pescar” garotos para lhe satisfazer o ego ferido. A linda filha dela se apaixona por um destes rapazes(italiano filho de Totó) e é corneada pela própria mãe.Ambiente bem familiar...
Tem também um filho viciado em drogas( o lindo Cauã Reymond) e outro bonzinho e corno( não me perguntem o nome do artista..artista?), que ama a menina que o irmão drogado comeu e que abortou a criança.
Não custa lembrar que o empregadinho da casa é gay e foi colocado pelo marido Saulo na mansão para controlar a esposa infiel,  que conseguiu tal intento por ser  amante da irmã do mordomo, a Laura, secretaria dele na empresa.
O Totó, nem se fala.Uma riqueza de personagem: tem uma filha corna, a pobre Agostina que é casada com um bígamo , que é casado também com a filha ninfomaníaca (Jéssica- Gabriela Duarte) de um casal de velhos(Francisco Cuoco e Irene Ravache) também ninfomaníacos cujo sujeito vem a descobrir lá pelas tantas que é o pai do Totó.
É inacreditável como S.Paulo e Toscana ficaram pequenas para que todos fossem parentes nesta trama,e uns traíssem os outros numa infindável teia de sedução e mentiras, basta ver que a bela mulher do Totó, Clara,(Mariana Ximenes) é amante do filho viciado da Dama do Lotação com o ex-Malandro Agulha, que é sobrinho do Totó...Ufa.
Repetindo para eu mesma não me atrapalhar: o sobrinho do Totó, drogado, é apaixonado pela mulher do Totó, ex-puta profissional, ladra, que foi criada pela avó cafetina das netas, que as prostituía para explorá-las, inclusive a menor de idade.
Clara por sua vez, já mulher do Totó é amante do principal bad da novela, Fred, em ótima interpretação de Gianecchini , o malandrinho, bandido, cafetão, receptador etc. que come também a filha da velha Beth Gouvêa, a Melina futurista.
Agora, na virada da novela, aparece Clara como uma boa moça, trabalhando em uma trattoria, ganhando no mês o que ganhava em horas na prostituição e nos engôdos.
Porém, neste ínterim, Totó decepcionado pelo se amor se apaixona pela boazinha da Felícia, irmã do gigolô Fred, (que comia a Clara- mulher dele), que é a mãe da menina apaixonada pelo viciado em droga, que come a mulher do Totó... Dá para acreditar ????
E que ainda por cima, complementando, é uma menina que tinha um pai misterioso  e de repente descobre o mesmo por uma foto antiga !É o Gérson - o bonitinho, corno e suícida, corredor de carros, filho da viúva genial...
Essa zorra toda ocorre no horário da 21 horas, apesar de ser chamada novela das oito, entre tres famílias apenas: a da velha viúva Beth Gouvea que só não morre na novela por ter um coração muito forte, a da Clara onde a avó já explorava menores e da ex futura esposa do Totó que já interpretou Maysa e se prestou para um papel tão ridículo, como filha de uma feirante que acaba com Gérson, paixão da adolescencia e que se cura insntaneamente de um problema sexual que parecia insolúvel.
Isto que ainda não se falou do filho do chofer (Rodrigo Lombardi) o machão  Raj do Caminho das índias, e que se tornou um boiola conversando com a filha recém nascida de tanto tatibitati, filho adotivo da velha, presidente da metalúrica, que come a filha e a nora da d.Beth, o honesto competente e bonzinho Mauro.
E o velho dos velhos, o já empalhado falso avô paterno do Totó que foi apaixonado e deixado no altar pela irma do Totó, a moralista Gemma?
E a velha esposa do velho avô do Totó a também empalhada Brígida, se  insinuando  desde o início da novela ao motorista da família, dentro da própria casa, se escondendo do velho marido...
E o pior vem agora: depois que Totó morre com polícia presente, ambulância, direito a exame de corpo de delito e tudo mais, ele volta para se vingar da esposa impura e interesseira e em conluio com o amante da própria que se fazia de bandido mas era policial, e comia( dizem que sem querer) armam uma cilada para a loira mau caráter.
Bem, só falei a metade do que vi e já me sinto com um nó no cérebro
Rezo para que chegue logo sexta feira onde tudo se encaixará, os maus serão punidos e os bons viverão felizes para sempre!

Por favor,peçam à Globo mais respeito pelo seu público!

domingo, 2 de janeiro de 2011

Devaneios etcétera e tal...: Família é prato difícil de preparar.

Devaneios etcétera e tal...: Família é prato difícil de preparar.: "Extraído do texto 'O Arroz de Palma”, de Francisco Azevedo! Família é prato difícil de preparar. São muitos ingredientes. Reunir todos é u..."

Família é prato difícil de preparar.


Extraído do texto "O Arroz de Palma”, de Francisco Azevedo!

Família é prato difícil de preparar. São muitos ingredientes. Reunir todos é um problema, principalmente no Natal e no Ano Novo. Pouco importa a qualidade da panela, fazer uma família exige coragem, devoção e paciência. Não é para qualquer um. Os truques, os segredos, o imprevisível. Às vezes, dá até vontade de desistir.
Preferimos o desconforto do estômago vazio. Vêm a preguiça, a conhecida falta de imaginação sobre o que se vai comer e aquele fastio. Mas a vida, (azeitona verde no palito) sempre arruma um jeito de nos entusiasmar e abrir o apetite. O tempo põe a mesa, determina o número de cadeiras e os lugares. Súbito, feito milagre, a família está servida.
Fulana sai a mais inteligente de todas. Beltrano veio no ponto, é o mais brincalhão e comunicativo, unanimidade. Sicrano, quem diria?endureceu, murchou antes do tempo. Este é o mais gordo, generoso, farto, abundante.
Aquele o que surpreendeu e foi morar longe. Ela, a mais apaixonada. A outra, a mais consistente.
E você? É, você mesmo, que me lê os pensamentos e veio aqui me fazer companhia. Como saiu no álbum de retratos? O mais prático e objetivo? A mais sentimental? A mais prestativa? O que nunca quis nada com o trabalho? Seja quem for, não fique aí reclamando do gênero e do grau comparativo. Reúna essas tantas afinidades e antipatias que fazem parte da sua vida. Não há pressa. Eu espero. Já estão aí? Todas? Ótimo.
Agora, ponha o avental, pegue a tábua, a faca mais afiada e tome alguns cuidados. Logo, logo, você
também estará cheirando a alho e cebola. Não se envergonhe de chorar. Família é prato que emociona. E a gente chora mesmo. De alegria, de raiva ou de tristeza.
Primeiro cuidado: temperos exóticos alteram o sabor do parentesco. Mas, se misturadas com delicadeza, estas especiarias, que quase sempre vêm da África e do Oriente e nos parecem estranhas ao paladar tornam a família muito mais colorida, interessante e saborosa.
Atenção também com os pesos e as medidas. Uma pitada a mais disso ou daquilo e, pronto, é um verdadeiro desastre. Família é prato extremamente sensível. Tudo tem de ser muito bem pesado, muito bem medido.
Outra coisa: é preciso ter boa mão, ser profissional. Principalmente na hora que se decide meter a colher.
Saber meter a colher é verdadeira arte. Uma grande amiga minha desandou a receita de toda a família, só porque meteu a colher na hora errada.
O pior é que ainda tem gente que acredita na receita da família perfeita. Bobagem. Tudo ilusão. Não existe Família à Oswaldo Aranha; Família à Rossini; Família à Belle Meunière; Família ao Molho Pardo, em que o sangue é fundamental para o preparo da iguaria. Família é afinidade, é “à Moda da Casa”. E cada casa gosta de preparar a família a seu jeito. Há famílias doces. Outras, meio amargas. Outras apimentadíssimas. Há também as que não têm gosto de nada, seriam assim um tipo de Família Dieta, que você suporta só para manter a linha. Seja como for, família é prato que deve ser servido sempre quente, quentíssimo. Uma família fria é insuportável, impossível de se engolir.
Enfim, receita de família não se copia, se inventa. A gente vai aprendendo aos poucos, improvisando e
transmitindo o que sabe no dia a dia. A gente cata um registro ali, de alguém que sabe e conta, e outro aqui,que ficou no pedaço de papel. Muita coisa se perde na lembrança. Principalmente na cabeça de um velho já meio caduco como eu. O que este veterano cozinheiro pode dizer é que, por mais sem graça, por pior que seja o paladar, família é prato que você tem que experimentar e comer. Se puder saborear, saboreie. Não ligue para etiquetas. Passe o pão naquele molhinho que ficou na porcelana, na louça, no alumínio ou no barro. Aproveite ao máximo. Família é prato que, quando se acaba, nunca mais se repete.
Desejamos a todas as famílias nesse natal e no decorrer de 2011, 2012, e assim sucessivamente, que
reencontrem os ingredientes mais nobres e necessários, e, a sabedora e inteligência para fazer da família a mais deliciosa das dietas, com muita paz, serenidade, amizade, amor e compreensão.